A Crítica de George Santayana a filosofia de Friedrich Nietzsche
Por Janilson Fialho
George Santayana foi um filósofo e crítico literário espanhol-americano responsável por fazer críticas bastante duras ao que ele chamava de "egotismo alemão". Santayana nessa crítica também apresentou suas queixas contra a filosofia de Friedrich Nietzsche. Deste modo, veremos então neste pequeno texto o que Santayana pensava a respeito do "filósofo do martelo".
Em primeiro lugar, Santayana argumenta que Nietzsche exalta excessivamente o indivíduo e seu poder de vontade, negligenciando a importância das relações sociais e da comunidade. Podemos notar claramente nas obras de Nietzsche — e podemos destacar A Genealogia da Moral, por exemplo — que ele tem horror a qualquer tipo de "nivelamento" do indivíduo a um padrão social, porque isso era o mesmo que servir (ou se reduzir) a uma "moral de rebanho". O filósofo alemão pode, em um certo ponto, está certo quanto a moral de rebanho ser um problema, no entanto, o excesso de ego em sua obra faz também ser um problema.
Santayana usa uma palavra nuito perspicaz para descrever o que ele considera o maior erro de nietzsche: o "egotismo" (ego). Parafraseando Santayana, vemos o seguinte: Nietzsche dava um valor exagerado a si mesmo, é um grande erro achar que o motivo da nossa existencia e da nossa vontade reside apenas em nós mesmos e que é um erro acreditar que a lógica e nossa vontade própria é o necessário para conduzir nossa mente e nossa consciência. Somos seres em um sistema deveras complexo e dependemos de outras variáveis. Temos limitações biológicas, geográficas e sociais. Todas essas variáveis criam as minhas faculdades mentais e limitações diante ao mundo.
Além disso, uma das principais críticas de Santayana ao egotismo de Nietzsche é que ele via a "vontade de poder" como a essência fundamental da existência humana, como se isso fosse um tipo de metafísica, alias, até mesmo o filósofo Martin Heidegger apontou que essa potência como vontade geral é um tipo de visão metafísica, o que contradiz esse filósofo crítico da metafísica. Deste modo, para Santayana, essa ênfase na vontade de poder acaba por reduzir bastante a complexidade da vida humana e também ignora outras coisas, como a importância de valores sociais, éticos e morais; cabe até dizer que tem um texto de Santayana que ele considera a visão de Nietzsche sobre a ética igual a de um aprendiz preguiçoso.
Por conseguinte, Santayana também criticava a visão de Nietzsche de que o indivíduo deve se libertar de todas as restrições e tradições sociais para alcançar sua plena realização — ou seja, ele deve se tornar o Übermensch (além-do-homem), isto é, aquele que é capaz de criar os próprios valores, assim se tornando um ser humano superior aos demais. Contrário a essa ideia, Santayana argumenta que essa perspectiva poderia levar ao isolamento e à indiferença em relação aos outros, prejudicando a coesão social e a capacidade de construir uma comunidade saudável, além de que esse egotismo é um tanto cego a respeito das próprias limitações, para não dizer que é uma ignorância somada a um ego extremo.
Em suma, podemos resumir até aqui que Santayana critica o egotismo de Nietzsche ao enfatizar a necessidade de equilibrar a afirmação do indivíduo com a consideração pelos outros e a valorização das relações sociais e comunitárias. Ele julgava que Nietzsche negligenciava esses aspectos em sua filosofia, o que poderia levar a uma visão distorcida e individualista da existência humana. A partir de agora, teremos uma crítica mais ácida contra o filósofo alemão.
Santayana julgava que Nietzsche era um "inválido constitucional", um profeta tardio do romantismo que preferia "a atmosfera revigorante de falsidade, paixão e perspectivas subjetivas" à verdade. Assim diz Santayana:
"O que Nietzsche menosprezou, então, sob o nome de moralidade, não foi toda moralidade, pois ele tinha uma moralidade mestre entusiástica para impor. Ele estava pensando apenas nas virtudes cristãs e especialmente em um certo moralismo protestante e kantiano com o qual talvez ele estivesse farto. Esse moralismo concebia que o dever era algo absoluto e não um método de garantir quaisquer bens de todos os tipos que possam ser alcançados pela ação. Esta última é a opinião comum e sólida, mantida, por exemplo, por Aristóteles; mas Nietzsche, que não era humilde o suficiente para aprender muito pelo estudo, pensava estar propondo uma doutrina revolucionária quando colocava os bens e os males além e acima do certo e do errado... Nietzsche, então, longe de transcender a ética, restabeleceu-a em seu verdadeiros alicerces, o que não quer dizer que o edifício esboçado que ele planejou erguer sobre esses alicerces tivesse um belo estilo de arquitetura ou pudesse permanecer de pé." (Santayana, capítulo 12: The Ethics of Nietzsche, tradução nossa).
Na passagem em questão, Santayana sugere que Nietzsche erra ao considerar sua proposta como uma revolução ética verdadeira, argumentando que ele não transcendeu a toda ética, mas a restabeleceu em seus alicerces extremamente subjetivos contra o que considera como "bem" e "mal". A crítica implica que, ao tentar superar o moralismo tradicional — isto é, as virtudes cristãs, o moralismo protestante e kantiano —, Nietzsche acaba por afirmar a importância de sua própria ética contra o que considera ser fraco, embora de uma maneira que pode ser considerada falha ou desarticulada — seu "edifício" ético-moral careceria de um "belo estilo de arquitetura" e de uma base sólida.
A observação de que Nietzsche não era "humilde o suficiente para aprender muito pelo estudo" é significativa. É certo que Nietzsche é filólogo, o que implica — e isso é evidente em sua obra — que ele tem um contato muito forte com a cultura helênica e principalmente com os pré-socráticos, mas filósofo sugere que a postura arrogante de Nietzsche em relação à tradição filosófica o impediu de construir uma ética que fosse verdadeiramente inovadora e duradoura.
Outro aspecto que Santayana destaca na filosofia de Nietzsche é a ideia de que a vida e qualquer forma de existência estão inextricavelmente ligadas ao exercício da força. No entanto, os tipos de força exercidos são heterogêneos e frequentemente incompatíveis. A força de Lúcifer, por exemplo, não garante a vitória na guerra, mas antes aponta para o fracasso em um mundo dominado por milhões de pessoas tímidas, piedosas e democráticas. Essa contradição leva Nietzsche a uma reflexão melancólica, questionando:
"Por que os fracos são vitoriosos?" Irritava-o o fato de que no mundo antigo as aristocracias marciais haviam sucumbido diante do cristianismo e no mundo moderno antes da democracia. Por força, então, ele não poderia significar o poder de sobreviver, por ser tão flexível quanto as circunstâncias pudessem exigir. Ele não se referiu à força das maiorias, nem à força dos vermes. Ao mesmo tempo, ele não se referiu à força moral, pois de força moral ele não tinha ideia." (Santayana, capítulo 12).
Assim, quando ele fala da vontade de ser poderoso, o poder é apenas uma palavra eloquente em seu lábios. Simboliza a fuga da mediocridade. O que seria o poder quando alcançado e exercido permanece inteiramente além de seu horizonte. O que nós encontramos em todos os lugares é a sensação de impotência e uma rebelião apaixonada contra ela.
Neste ponto, Santayana diz que Nietzsche pensa ter descoberto sozinho a divindade de Dionísio e das Musas, que Platão tomou como algo natural, mas não veneraria supersticiosamente. A inspiração, como a vontade, é uma força sem a qual a razão nada pode fazer. A inspiração deve ser pressuposta; mas em si mesmo não pode fazer nada de bom, a menos que esteja em harmonia com a razão, ou seja posto em harmonia com ela. Essa sabedoria de dois gumes que faz do impulso a matéria da vida e da razão seu critério é, é claro, perdida em Nietzsche e, com ela, em toda a maravilha do gênio grego.
A impulsividade e a vivacidade não são qualidades exclusivas de grandes líderes ou pensadores. Qualquer pessoa pode se deixar levar por suas emoções e paixões, como observa Santayana. No entanto, a verdadeira virtude reside na capacidade de controlar os apetites e as vontades, portanto, governar a si mesmo de forma racional. Como afirma Santayana, "a virtude dos gregos residia na firmeza primorosa com que eles abafavam seus fogos sem apagá-los" (Cr. DURANT, 199, p. 405). Essa capacidade de autocontrole permitiu que os gregos desenvolvessem uma vida interior rica e humana, que os tornou belos e admiráveis.
Essa abordagem grega à vida é fundamentalmente diferente, segundo Santayana, da ideia do além-do-homem de Nietzsche, porque a perspectiva do filósofo alemão defende a liberação das paixões e a busca pela excelência individual. Em contraste, os gregos valorizavam a moderação e o autocontrole, o que lhes permitiu desenvolver uma forma de perfeição que era ao mesmo tempo humana e bela.
Contudo, apresentamos aqui as críticas de Santayana contra Nietzsche. Apesar de percebermos uma falta de compreensão mais profundada nas ideias de Nietzsche, especialmente em relação à "vontade de poder" e o "além-do-homem", e também de uma discussão filosófica mais produtiva e respeitosa, que evite ataques pessoais e se concentre em uma análise crítica e construtiva das ideias filosóficas, os pontos levantados pelo filósofo são, no mínimo, bastante instigantes.
Referência:
DURANT, Will. Os pensadores: A história da filosofia. Tradução de Luiz Carlos do Nascimento Silva. — São Paulo: Nova Cultural, 1996.
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