O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (211 e 212), por Janilson Fialho

O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (211 e 212)

Por Janilson Fialho

O equilíbrio total do cosmos só pode ser mantido, se a mudança numa direção conduzir eventualmente à mudança na outra, isto é, se houver uma "discórdia" infindável entre contrários. Vejamos os seguintes fragmentos.

Fr. 211: É necessário saber que a guerra é comum e que a justiça é discórdia e que tudo acontece mediante discórdia e necessidade.

 Fr. 212: A guerra é a origem de todas as coisas e de todas ela é soberana, e a uns ela apresenta-os como deuses, a outros, como homens; de uns ela faz escravos, de outros, homens livres.

A metáfora favorita de Heráclito é a discórdia ou a guerra como predomínio do mundo. Mas tal metáfora não deve ser interpretada pelo sentido literal da guerra; ela está na verdade nessa concepção relacionada com a reação entre contrários:

“Não se confundam conflito e devastação guerreira. O conflito cria e preserva – ele é pai e rei. Responsável pela correlação de todas as coisas, o conflito congrega. Sem ele os seres seriam arrastados em desordem. Não se exclua a filia do conflito” (Schüler, 2000, p. 233).

Deste modo, ao conflito em caso de uma mudança extrema de um para o outro, pode-se afigurar-se como radical. Nos fragmentos 211 e 212, a guerra está na base original de todos os acontecimentos num sentido particular, ou como Homero a significou como “imparcial”, porque a guerra é universal e responsável por condições opostas do homem, até mesmo no seu destino: a morte. O conflito é, portanto: “o estrondo da luta em contraste com o silêncio dos que dormem opõe a vida à morte. Assim o conflito é pai” (Schüler, 2000, p. 235).

Heráclito mostra que a discórdia – ou seja, a ação e a reação é necessária das substâncias contrárias – se por acaso viesse a acabar, o vencedor de cada “conflito” entre os extremos iria estabelecer um domínio permanente, o que levaria o mundo de certa maneira a ser destruído; podemos imaginar a seguinte situação apresentada por Aristóteles: "Heráclito censura o autor do verso 'quem dera que a discórdia desaparecesse de entre os deuses e os homens': pois não haveria escala musical, se não existissem os sons agudos e grave, nem seres vivos sem fêmea e macho, que são opostos" (Cf. Ética a Eudemo, H I, 1235 a 25).

Contudo, igual a uma batalha há pontos onde ocasionam um exato equilíbrio de forças que se opõem validando o domínio da discórdia, a guerra pode ser vista como um elemento que cria e destrói, que molda e transforma a sociedade e a humanidade em geral.

Referências:

SCHÜLER, Donald. Heráclito e seu (Dis)curso. – L± Edição de bolso, 2000.

KIRK, G. S.; RAVEN, J. E.; SCHOFIELD, M. Os filósofos pré-socráticos: História crítica com seleção de textos. Tradução de Carlos Alberto Louro Fonseca. 4ª edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

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