O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (217, 218, 219 e 220), por Janilson Fialho
O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (2017, 218, 219 e 220)
Por Janilson Fialho
O mundo é um fogo sempre a arder; algumas das suas partes estão sempre extintas para formar as duas outras principais massas do mundo, o mar e a terra. As mudanças entre o fogo, o mar e a terra equilibram-se mutuamente; o fogo puro, ou etéreo, tem a capacidade diretiva. Assim são as ideias dos próximos fragmentos.
Fr. 217: Esta ordem do mundo [a mesma de todos] não criou nenhum dos deuses, nem dos homens, mas sempre existiu e existe e há-de existir: um fogo sempre vivo, que se acende com a medida e com medida se extingue.
Fr. 218: As mudanças do fogo: em primeiro lugar, o mar, e do mar a metade é terra, e a outra metade 《o que queima》[i.e., o raio ou o fogo]... <a terra> dispersa-se em mar e mede-se de modo a formar a mesma proporção que existia antes de se formar em terra.
Fr. 219: Todas as coisas são uma igual troca pelo fogo e o fogo por todas as coisas, como as mercadorias o são pelo ouro e o ouro pelas mercadorias.
Fr. 220: O raio governa todas coisas.
Para Heráclito, o fogo é a forma arquetípica da matéria. O fogo é a ordem do mundo como “um todo”, cuja certas porções estão a passos equivalentes de se extinguir e reacender. Contudo, na filosofia de Heráclito, o fogo é um símbolo da mudança constante e da transformação contínua da realidade. Ele acreditava que essa ordem do mundo sempre existiu e continuará existindo, e que é governada por um fogo sempre vivo que se ascende e se extingue com medida, como podemos ver no fragmento 217. Para Heráclito, o fogo é uma metáfora para a natureza dinâmica do universo e para a ideia de que tudo está em constante fluxo e mudança.
Heráclito diz no fragmento 218 o seguinte: que o fogo muda constantemente e que uma das suas formas de transformação é o mar. Ele afirma desta maneira que metade do mar é terra, enquanto a outra metade é aquilo que queima, ou seja, é a parte que se transforma em fogo. E essa parte do fogo que queima se dispersa no mar e se mede de modo a formar a mesma proporção que existia antes de se transformar em terra. Essa citação de Heráclito mostra a ideia de que o mundo, a natureza, está em constante mudança e transformação, e que todas as coisas estão interligadas e se influenciam mutuamente. Portanto, o fogo está fazendo parte dessa origem ininterrupta desses processos naturais como sendo, na verdade, um fogo puro que regula a matéria.
O filósofo passa a seguinte ideia no fragmento 219, de que tudo no universo está em uma constante troca que se realiza pelo fogo. Essa troca pode ser comparada a um sistema de mercado em que as coisas são trocadas pelo ouro. Por exemplo, o fogo pode transformar madeira em cinzas, água em vapor, e assim por diante. Essa troca constante pelo fogo também é um símbolo da interconexão de todas as coisas, já que cada elemento está conectado e influencia o outro. Portanto, a frase de Heráclito sobre a troca igual das coisas pelo fogo pode ser interpretada como uma metáfora da harmonia dos contrários, da interdependência de todas as coisas e da necessidade da constante mudança para que o universo possa existir e se transformar.
O que dizer do fragmento 220 senão voltar aquilo que foi dito no final de 218, porque é lá que está a nossa interpretação da ideia de pureza do fogo. Ele mostra que o fogo é a espécie mais pura e mais brilhante, isto é, a do raio etéreo e divino que tem a capacidade diretiva. O caráter divino do fogo é, portanto, atribuído à regularidade com que absorve combustível e emite fumaça, enquanto mantém uma estabilidade entre eles, incorporando, de forma evidente, a regra da medida na mudança, inerente ao processo cósmico, do qual o Logos é uma expressão. Contudo, o fogo é naturalmente concebido como constituinte verdadeiro das coisas, que determina ativamente a estrutura do comportamento da unidade da oposição dos contrários.
Referências:
KIRK, G. S.; RAVEN, J. E.; SCHOFIELD, M. Os filósofos pré-socráticos: História crítica com seleção de textos. Tradução de Carlos Alberto Louro Fonseca. 4ª edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
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