O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (203 e 204), por Janilson Fialho
O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (203 e 204)
Por Janilson Fialho
Cada par de contrários forma, por conseguinte, não apenas uma unidade como pluralidade. Verifica-se, também, que pares diferentes estão interligados. Vamos aos fragmentos:
Fr. 203: As coisas tomadas em conjunto são o todo e o não-todo, algo que se reúne e se separa, que está em consonância e em dissonância; de todas as coisas provém uma unidade, e de uma unidade, todas as coisas.
Fr. 204: O deus é dia-noite, Inverno-Verão, guerra-paz, saciedade-fome [todos os contrários, é o que isto significa]; passa por mudanças, do mesmo modo que o fogo, quando misturado com especiarias, é designado segundo o aroma de cada uma delas.
Todas as coisas são "tomadas em conjunto". Consideremos isso, por exemplo, o par "noite-dia", isso exprime termos de simples extremos opostos, ou contrários; podemos, portanto, classificar também que toda mudança pode ser considerada como sendo verificada entre os contrários. Nesse fragmento 203, todas as coisas tomadas em conjunto são descritas em um sentido como "o todo", ou seja, formando assim um todo contínuo com esses simples componentes contrários. Contudo, podemos então ver que todas as coisas formam uma unidade, e é dessa unidade que é possível separar o aspecto superficial, distinto e múltiplo das coisas.
Heráclito estabelece nesse fragmento 204, uma relação entre um certo número de pares contrários a uma característica divina, encontrando em cada um deles separadamente ligado a uma sucessão automática, e que representam assim todos os pares de contrários interligados. Heráclito parece ter considerado "o deus" como imanente às coisas. Ele nos faz lembrar de que a matéria originadora, que representa o mundo, é, portanto, algo divino.
Contudo, está em cada contrário essa característica divina; e o deus não pode ser aqui essencialmente diferente do Logos, pois o Logos é, entre outras coisas, o constituinte das coisas que as torna contrárias, e que a mudança superficial entre esses contrários é proporcional e equilibrada mantendo o seu constituinte mais importante. Portanto, a pluralidade total das coisas forma um complexo único, coerente e determinável, chamado de unidade.
Referências:
KIRK, G. S.; RAVEN, J. E.; SCHOFIELD, M. Os filósofos pré-socráticos: História crítica com seleção de textos. Tradução de Carlos Alberto Louro Fonseca. 4ª edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
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