O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (199, 200, 201 e 202), por Janilson Fialho

O Pensamento de Heráclito: comentários acerca dos seus fragmentos (199, 200, 201 e 202)

Por Janilson Fialho

Diferentes tipos de exemplo da unidade essencial dos contrários. Vejamos os fragmentos:

Fr. 199: A água do mar é a mais pura e a mais poluída; para os peixes é potável e salutar, mas para os homens é impotável e deletéria.

Fr. 200: O caminho a subir e a descer é um e o mesmo.

Fr. 201: A doença torna a saúde agradável e boa, como a fome, a saciedade, a fadiga, o descanso.

Fr. 202: E como uma mesma coisa, existem em nós a vida e a morte, a vigília e o sono, a juventude e a velhice: pois estas coisas, quando mudam, são aquelas, e aquelas, quando mudam, são elas.

Os fragmentos aqui exemplificam de maneira simples a conexão evidente que há entre as diferenças dos contrários. Portanto, ao analisarmos os contrários, de 199 a 201, percebe-se que eles, os contrários, são simultaneamente produzidos por um sujeito só; já no 202, são contrários que estão ligados por serem de diferentes fases de um processo invariável e único.

O fragmento 199, diz, portanto que a mesma coisa, isto é, a ideia de que a natureza é relativa e subjetiva, e que a percepção varia de acordo com a perspectiva; deste modo, a água do mar, produz efeitos contrários sobre diferentes classes de seres, sendo benéfica ao peixe e prejudicial ao ser humano. Com isso, podemos ver também que os burros preferem os desperdícios ao ouro, ao contrário disso temos o homem que prefere o ouro aos desperdícios.

O fragmento 200, aborda que os diferentes aspectos da mesma coisa podem justificar descrições contrárias. O exemplo dado nesse fragmento, isto é, que o próprio caminho a subir e a descer, que, para Heráclito, é sendo o mesmo caminho, pois ambos os movimentos ocorrem no mesmo espaço e tempo, e dependem um do outro para serem compreendidos. Por este exemplo do caminho podemos imaginar isso: "o herói sobe a alturas ambicionadas e retorna às suas precárias origens pelo mesmo caminho" (Schüler, 2000, p. 225). Entretanto, vejamos outro exemplo, a relação entre o dia e a noite, embora pareçam opostos, ambos são necessários para o ciclo natural do mundo, e um não pode existir sem o outro.

O fragmento 201, é, contudo, a dizer que a doença pode tornar a saúde algo valioso e desejável, já que a pessoa que se recupera de uma doença pode sentir-se grata e aliviada por estar saudável novamente. Da mesma forma, a fome pode tornar a saciedade ainda mais prazerosa, já que a pessoa que estava com fome pode sentir-se satisfeita ao comer e apreciar mais a comida. A fadiga pode tornar o descanso ainda mais reconfortante, já que a pessoa que estava cansada pode sentir-se renovada e descansada após um período de repouso. Enfim, esse fragmento de Heráclito sugere que as experiências negativas podem nos ajudar a valorizar ainda mais o seu contrário, isto é, as experiências positivas.

O fragmento 202, diz que certos contrários estão essencialmente ligados às coisas e que elas não são estáticas, mas sim estão em constante mudança e transformação, e que os opostos muitas vezes estão interligados e se transformam um no outro. Tomando como exemplo a vida e a morte, pode-se dizer que a vida é uma condição oposta à morte, mas que ambas estão presentes em nós ao longo da vida, e que uma pode se transformar na outra. Por exemplo, quando uma pessoa morre, a sua vida se transforma em morte. Da mesma forma, a vigília e o sono são opostos que se inter-relacionam, já que um indivíduo pode passar de um estado de sono profundo para um estado de vigília alerta. Já a juventude e a velhice são opostos que se transformam um no outro ao longo do tempo, já que uma pessoa jovem pode envelhecer e uma pessoa idosa pode recuperar a vitalidade da juventude. Essa visão de Heráclito sugere que as coisas não são absolutas e que o mundo está em constante.

Referências:

SCHÜLER, Donald. Heráclito e seu (Dis)curso. – L± Edição de bolso, 2000.

KIRK, G. S.; RAVEN, J. E.; SCHOFIELD, M. Os filósofos pré-socráticos: História crítica com seleção de textos. Tradução de Carlos Alberto Louro Fonseca. 4ª edição. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

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