Os três tipos de caminhos que a metafísica trilhou ao longo dos séculos, por Janilson Fialho
Os três tipos de caminhos que a metafísica trilhou ao longo dos séculos
Por Janilson Fialho
- Metafísica como Teologia:
O conceito de metafísica como teologia consiste em reconhecer como princípio Deus como o Ser mais elevado e perfeito, que provêm todos os outros seres e crises do mundo. O privilégio atribuído à metafísica decorre, neste caso, do caráter privilegiado do Ser que é seu objeto: este Ser, denominado como Deus, é superior a todos e do qual todos os outros provêm.
A tradição escolástica, na Idade Média, identificou a metafísica como sendo uma teologia, mesmo que ainda tenha se distinguido os métodos usados em ambas as coisas para explicar Deus, desta maneira, a metafísica, enquanto matéria de estudo, recorre à razão enquanto a teologia, vista somente como religião, se baseia na revelação divina. Entretanto, mesmo que haja uma tentativa de separar teologia da metafísica, mas a metafísica é tida pelos filósofos cristãos como teologia natural, ou seja, o estudo sobre Deus baseado na razão e sem o auxílio da revelação que Deus teria feito de si mesmo nas escrituras.
Podemos ver essa defesa da razão em São Tomás de Aquino, que em sua obra "Suma Teológica" defende que Deus é o princípio e o fim de todas as coisas e que, fazendo apenas o uso da luz natural da razão a partir das coisas criadas, porém, devemos dizer que a metafísica teológica na visão de S. Tomás tem como teoria da substância que não inclui Deus entre seus objetos possíveis, porquanto Deus não é substância (S. Th., 1, q. 1, a. 5, ad 1ª). Mas um pouco antes de Tomás de Aquino, temos, por exemplo, a metafísica teológica de Plotino estabelecendo como correspondência entre ser primeiro e perfeito, ou o Uno, como sendo uma ciência igualmente primeira e perfeita. É teológica, portanto, que, às ciências que têm o sensível por objeto, contrapõe as que têm por objeto o inteligível, ou seja, a realidade suprema: "entre as ciências que estão na alma racional, algumas têm o objeto as coisas sensíveis, se é que podem ser chamadas ciências, já que melhor lhes caberia o nome de opiniões; elas vem depois das coisas e são imagens delas".
Podemos ir mais adiante na história para citar o filósofo Hegel, este que também tem sua metafísica fundamentada na raiz teológica, ao afirmar que tem Deus como objeto: "a filosofia tem objetos em comum com a religião porque o objeto de ambas é a verdade, no sentido altíssimo da palavra, porquanto Deus e somente Deus é a verdade" (Enc., §1).
- Metafísica como Ontologia:
A ontologia é a área da filosofia, ou melhor, da metafísica que estuda, assim como a teologia, a natureza do ser, da existência e da própria realidade. A Ontologia é classificada na filosofia como o ramo geral da metafísica (diferente da teologia, e de outros ramos específicos da filosofia), pois se ocupa dos temas mais abrangentes e abstratos da área.
A concepção fundamental da metafísica como ontologia, ou a doutrina que estuda os caracteres fundamentais do ser, é: que todos os seres têm e não podem deixar de ter. Sendo assim, as principais proposições da metafísica ontológica são as seguintes: 1ª Existem determinações necessárias do ser, ou seja, determinações que nenhuma forma ou maneira de ser pode deixar de ter. 2ª Tais determinações estão presentes em todas as formas e modos de ser particulares. 3ª Existem ciências que têm por objeto um modo de ser particular, isolado em virtude de princípios cabíveis. 4ª Deve existir uma ciência que tenha por objeto as determinações necessárias do ser; essas também reconhecíveis em virtudes de um só princípio cabível. 5ª Essa ciência precede todas as outras e é, por isso, a ciência primeira, porquanto, consequentemente, seu princípio condiciona a validade de todos os outros princípios.
A metafísica expressa nessas proposições uma via de regra que implica: a) determinada teoria da essência, mais precisamente da essência necessária; b) determinada teoria do ser predicativo, mais precisamente da inerência; c) determinada teoria do ser existencial, mais precisamente da necessidade. Portanto, dos exemplos anteriores podemos citar o filósofo Aristóteles, este vai dizer que a substância é o objeto da metafísica por constituir o princípio de explicação de todas as coisas existentes: "a substância de cada coisa é a causa primeira do ser dessa coisa. Algumas coisas não são substâncias, mas as que são substâncias são naturais e postas pela natureza, estando, pois, claro que a substância é a própria natureza e que não é elemento, mas princípio" (Met. VII, 17, 1041 b 27).
Historicamente foi no século XVII que houve uma distinção mais abrupta entre a metafísica e a teologia, que fez a metafísica ser designada por ontologia, este nome aparece em Schediasma historicum (1655), de Jacobus Thomasius, e é justificada por Clauberg do seguinte modo: “Assim como se chama de teosofia ou teologia a ciência que trata de Deus, não parece impróprio que se chame de ontosofia ou ontologia a ciência que verse sobre o ente em geral, e não sobre este ou aquele ente designado por um nome especial ou distinto dos outros por certa propriedade” (Op. Phil. 1691, I, p. 281). Uma ontologia assim entendida, nitidamente distinta da teologia, não implicava nenhum antagonismo contra os dados da experiência. Ao contrário, essa ontologia começa a ser considerada caracteres como a exposição organizada e sistemática dos caracteres fundamentais do ser que a experiência revela de modo repetido ou constante.
Por meio do que foi dito agora chegamos ao conceito de metafísica de Wolf. A ontologia de Wolf é uma teoria que lida com a natureza fundamental do ser e da existência. Na ontologia de Wolf, o ser é definido como tudo aquilo que tem existência, e a existência é definida como a capacidade de uma coisa para ser percebida ou ter efeito no mundo. Wolf também argumentou que o conhecimento das coisas é baseado na sua essência, que é a combinação de suas características. A ontologia de Wolf teve uma grande influência na filosofia alemã do século XIX e continua a ser discutida na filosofia contemporânea.
Contudo, podemos citar por último o filósofo M. Heidegger, cuja ontologia é a investigação filosófica entendida só como a determinação do sentido do ser a partir do ser do ente que faz as perguntas e dá as respostas. Ele acredita que a ontologia deve começar com uma análise da existência humana em sua situação temporal e histórica, em vez de começar com as categorias abstratas de ser e não ser. Heidegger argumenta que a existência humana é caracterizada por sua relação com o mundo. O ser humano é sempre "jogado" no mundo, e sua existência é moldada por sua experiência desse mundo. A ontologia de Heidegger é, portanto, uma ontologia da existência humana, focada nas condições que tornam possível a compreensão e a interpretação do mundo.
Uma das principais contribuições de Heidegger para a ontologia é sua ideia de que o ser não é uma propriedade ou uma característica das coisas, mas algo que se revela a partir da experiência humana. Ele argumenta que o ser não pode ser definido com palavras ou conceitos, mas ser-aí deve ser descoberto por meio da experiência direta, como a angústia, por exemplo.
- Metafísica como Gnosiologia:
A metafísica como gnosiologia argumenta que o conhecimento é a base para a compreensão da realidade e que a realidade é determinada pelo conhecimento. Nessa visão, a filosofia se concentra em entender a estrutura fundamental da realidade e como podemos conhecê-la. A metafísica como gnosiologia é, portanto, uma abordagem crítica e sistemática que busca entender a essência das coisas e as leis que governam o universo. É uma das áreas fundamentais da filosofia e tem influenciado muitos campos, incluindo as ciências naturais, matemática e filosofia da mente.
Podemos entender a metafísica sendo aplicada a gnosiologia por meio desses exemplos:
- O estudo da base ontológica do conhecimento: a metafísica investiga as questões fundamentais da existência, incluindo a natureza da realidade objetiva que o conhecimento tenta compreender;
- A natureza da intuição: a metafísica pode oferecer insights sobre a fonte das ideias e conceitos fundamentais no processo cognitivo, como a natureza da intuição;
- A relação entre o sujeito e o objeto do conhecimento: a metafísica pode fornecer uma base para entender como os objetos do conhecimento podem influenciar ou ser afetados pela atividade cognitiva do sujeito;
- A natureza da verdade e da certeza: a metafísica pode explorar questões fundamentais relacionadas à natureza da verdade e da certeza, oferecendo uma abordagem mais profunda para a análise das teorias cognitivas.
O conceito de metafísica como gnosiologia (ou teoria do conhecimento) é expresso por Kant. Segundo Kant, a metafísica é o estudo das formas ou princípios cognitivos que, por serem constituintes da razão humana — aliás de toda razão finita em geral —, condicionam todo saber e toda ciência, e de cujo exame, portanto, é possível extrair os princípios gerais de cada ciência. A característica da metafísica kantiana é a sua pretensão de ser “uma ciência de conceitos puros", ou seja, uma ciência que abarque os conhecimentos que podem ser obtidos independentemente da experiência, com base nas estruturas racionais da mente.
Podemos ver então assim, como a metafísica “científica” ou “crítica”, ou seja, a metafísica kantiana contrapunha-se a metafísica dogmática tradicional. Segundo Kant, da metafísica crítica ou ontológica fazem parte a metafísica da natureza e a metafísica dos costumes. A metafísica da natureza compreende que “todos os princípios racionais puros decorrentes de simples conceitos (portanto, com exclusão da matemática) da ciência teórica de todas as coisas”. Também podemos ver a metafísica dos costumes que compreende que: “os princípios que determinam a priori e tornam necessário o fazer ou não fazer”, sendo, portanto, a “moral pura” (Crít. R. Pura, Doutr. do método, cap. 3)
Além de Kant, outros filósofos trataram e formularam a gnosiologia, como:
- Platão - Filósofo grego que desenvolveu a teoria das formas, na qual afirmava que existe um mundo ideal e perfeito onde as ideias são reais e imutáveis, enquanto o mundo físico é apenas uma cópia imperfeita desse mundo.
- Aristóteles - Outro filósofo grego importante que contribuiu para a gnosiologia, ele acreditava que todo o conhecimento humano começa com a percepção, e que o nosso entendimento é construído a partir de uma série de experiências sensoriais.
- René Descartes - Filósofo francês que era conhecido pela sua famosa frase "Penso, logo existo". Ele foi um dos primeiros a questionar a natureza do conhecimento humano e a tentar entender a relação entre a mente e o corpo.
- John Locke - Filósofo inglês que argumentou que todo conhecimento humano é construído a partir da experiência sensorial e que a nossa mente é uma "folha em branco" no momento do nascimento.
- Edmund Husserl - Filósofo alemão que desenvolveu a fenomenologia, uma escola de pensamento que se concentra nas experiências subjetivas da consciência humana e na maneira como percebemos o mundo ao nosso redor.
Contudo, estes foram os principais conceitos e áreas da metafísica apresentados nesse texto.
Comentários
Postar um comentário