As quatro “definições” da metafísica aristotélica

As quatro “definições” da metafísica aristotélica

 Por Janilson Fialho

1. Primeira definição: metafísica como ciência das causas e dos princípios primeiros e supremos:

Aristóteles entendia que o objetivo da metafísica era descobrir a causa fundamental de todo o universo e que essa causa seria um ser necessário e eterno. Esta primeira definição caracteriza a metafísica como o "conhecimento das causas e princípios primeiros". Até podemos ter noção e cognição das coisas, dos eventos e dos acontecimentos em dois níveis diferentes, como vamos ver no exemplo a seguir: todos sabem que o fogo aquece e queima; para saber isso bastam a sensação e a constatação empírica. Porém, poucos sabem por que o fogo aquece e queima. Quem sabe apenas que o fogo aquece e queima tem apenas noções empíricas; ao invés, quem sabe o porquê ou a razão pelo qual o fogo aquece e queima possui o verdadeiro conhecimento e ciência.

Sobre isso, diremos, portanto, que o primeiro tipo de saber limita-se à verificação empírica, isto é, à constatação do fato da coisa ser, ou ser de certo modo; ao contrário, o conhecimento verdadeiro alcança o "porquê" e a razão de ser da coisa. Portanto, aquele que possui a ciência, ou o conhecimento, não só sabe que as coisas são o que são de determinado modo, mas sabe, particularmente, "por quê" são daquele modo determinado e não de outro.

A causa ou o princípio de algo não é mais do que o porquê da própria coisa, ou seja, a razão de ser da coisa, é aquilo por quê a coisa é e é aquela que é. As causas e os princípios podem ser, portanto, definidos como as condições ou os fundamentos das coisas, ou enquanto são o que condiciona as coisas. Sendo assim, se por acaso, se se excluem as causas e os princípios, excluem imediatamente também as próprias coisas.

Quando possuímos o conhecimento das causas e dos princípios de algo, sempre possuímos a ciência da "coisa", mas não necessariamente científica. A ciência metafísica só existe quando conhecemos certas causas e certos princípios. Podemos nos perguntar quais são eles, ou seja, quais são os "supremos" ou os "primeiros"? As causas e os princípios "primeiros" condicionam toda a realidade, isto é, as causas e os princípios que fundam os seres em sua totalidade.

Contudo, a metafísica é a ciência do "porquê" último de todas as coisas, ela é a ciência das razões supremas da realidade, por isso é ciência incomparavelmente superior a todas as outras ciências particulares.

2. Segunda definição: metafísica como ciência do ser enquanto ser:

Aristóteles percebeu que existe uma ciência que considera o ser enquanto ser, ou seja, que há uma ciência que estuda as coisas que existem em si mesmas e não dependem de outras coisas para existir. Ao contrário das ciências particulares que somente indagam dos seres somente determinações e certas características, a metafísica tem como objeto de indagação a realidade, não enquanto esta ou aquela realidade particular determinada, mas a realidade considerada enquanto tal, ou seja, a realidade enquanto realidade, ou como dissemos: do ser enquanto ser.

Desta forma, a área específica da metafísica que trata da natureza do ser enquanto ser, que é a realidade e a existência das coisas, é denominada de ontologia. O estagirita considera o ser nessa definição ontológica como um ser “inteiro”, assim ele fala de referência a uma única natureza e também de um único princípio: “assim também o ser se diz em muitos sentidos, mas todos em referência a um único princípio”*.

3. Terceira definição: metafísica como teoria da substância:

Aristóteles caracterizou sua metafísica como sendo uma "teoria da substância", e, deste modo, o metafísico como o que especula a respeito da substância. Portanto, não há a menor dúvida de que o problema usiológico constitui o centro da filosofia primeira de Aristóteles.

Segundo o Estagirita, o ser tem múltiplos significados, dos quais o de substância não só é o principal, mas até mesmo o fundamento de todos os outros. Se é assim, então a ciência das causas e dos princípios do ser deverá também configurar-se como a ciência das causas e dos princípios da substância**. Em primeiro lugar, é preciso definir o conceito de substância sendo o suporte ou substrato pelo qual a matéria se constitui em algo seguindo uma forma, ou seja, todas as substâncias são formadas por uma "Essência" e uma quantidade de "Acidentes". A essência seria a característica principal de uma coisa, sem a qual ela se descaracterizaria completamente, ficaria irreconhecível como sendo aquilo que ela é. Desta forma, a substância não está ligada a nada, ou seja, ela subsiste por si mesma e assim sendo ela funciona como substrato, pois, é aquilo de que são predicadas todas as outras coisas, enquanto ele não é predicado de nenhuma outra.

Contudo, a metafísica é denominada e definida, portanto, por Aristóteles como a ciência da substância ou, também, ciência das causas e princípios da substância.

4. Quarta definição: metafísica como ciência teleológica:

A metafísica é, por fim, repetidamente como sendo definida — implícita ou explicitamente — como teoria de Deus ou a "ciência teológica". E assim ele define isso:

"De fato, é convicção comum a que Deus seja uma causa e um princípio, e, também, que Deus, exclusivamente ou em sumo grau tenha esse tipo de ciência"***.

As conclusões do Estagirita a respeito da metafísica enquanto teologia são as seguintes: existe uma substância que é imóvel, que é ato puro e a causa final, ou seja, a substância que pode ser denominada de Deus; que é eterno e separado, o pensamento do pensamento mas esta não é dada nem pelas Ideias nem pelos entes matemáticos (como queriam Platão e os platônicos).

Contudo, a metafísica é a ciência divina: em primeiro lugar, porque é ciência de Deus (Deus é, de fato, o supremo dos princípios e a primeira das causas), e, em segundo lugar, porque, se por acaso alguém possui esta ciência em sua completude, este só pode ser o próprio Deus.

* Cf. Metafísica, 1003 b 

** Cf. Metafísica, Γ 2, 1003, b 15-19.

*** Cf. Metafísica, A 2, 983 a 5-10.