Kant e a questão da metafísica como ciência, Por Janilson Fialho
Kant e a questão da metafísica como ciência
Por Janilson Fialho
Será que na Metafísica não seria possível, segundo Kant, uma revolução do modo de pensar como aconteceu com as outras ciências na Modernidade, elevando-a ao grau de ciência?
Sabemos que na Crítica da razão pura encontram-se nela exposições detalhadas sobre a história das ciências. Portanto, Kant começa com uma apresentação dos desenvolvimentos efetuados pelas ciências da lógica, da matemática e da física. Logo em seguida ele relaciona estes avanços alcançados nestas ciências com a problemática da metafísica. Entretanto, será que na metafísica não aconteceu também uma revolução no modo de pensar igual aconteceu nas demais ciências? Ou ainda, será que ela não poderia ser também elevada a um grau de ciência?
Kant diz que a lógica tomou, já desde Aristóteles, um caminho seguro como ciência; também diz que desde o período grego antigo, a matemática pode também tomar o caminho seguro de uma ciência. Contudo, assim como essas duas, desde os últimos tempos, a ciência, sobretudo a física, por meio da revolução metodológica pela contribuição de Bacon e de Newton, pôde adentrar no caminho seguro da ciência.
A partir destas primeiras observações Kant salienta que um caminho para uma ciência segura foi possibilitado graças a uma revolução do modo de pensar, afinal, foi isto que elevou as ciências de um simples tateio com conceitos e representações para um grau elevado de conhecimento científico preciso. A revolução no modo de pensar na matemática, por exemplo, baseia-se na descoberta segundo a qual nosso conhecimento matemático realiza-se através de uma construção na intuição, ou seja, aquilo que nós, por força de uma construção mental, colocamos nas figuras da geometria, isto é, nas expressões por números, poderemos ter um conhecimento válido. Já na física, a revolução do modo de pensar aconteceu de um modo diferente. Sendo assim, Trata-se agora não de um conhecimento de caráter a priori, mas de uma novidade no procedimento empírico proporcionada pela introdução da experimentação. As experimentações tem como base as hipóteses sobre o possível comportamento da natureza. Desta forma, experimentar significa, forçar por meio de exames e experiências a natureza a responder às nossas questões.
Sabendo então sobre essas duas ciências (matemática e física), vemos, portanto, que de um lado, temos o exame da construção da intuição como o fundamento de todos os conhecimentos matemáticos, e do outro lado, que o conhecimento da necessidade de projetos para as suas comprovações é na experiência do conhecimento da natureza. Kant, em seguida, com a problemática da metafísica, pensa que seria possível também uma revolução no modo de pensar sobre ela, sendo possível então assim eliminar o simples tateio nos seus conceitos e representações.
Kant logo inicia sua exposição formulando a hipótese que supõe que nossos conhecimentos não se regulam pelos objetos, mas ao contrário, que os objetos se regulam pelas estruturas de nosso conhecimento. Admitindo-se assim que o conhecimento deveria se regular pelos objetos; entretanto, todas as tentativas para descobrir são apriori, isto é, mediante conceitos, como algo que ampliasse e regulasse o nosso conhecimento. Trata-se, contudo, de que não seriam as coisas que nos determinariam, mas nós que determinariam as coisas, assim tem-se como conseqüência o fato de que, para nós, só será possível um conhecimento a priori das coisas na experiência quando a experiência se regular pelas nossas formas de intuição e pelos nossos conceitos. Desta maneira, Kant diz que só podemos conhecer os fenômenos e não as coisas em si. O conceito fenômeno é definido, por ele, de tal modo que, para nós, somente poderá ser conhecido a priori aquilo que nós, por força de nossa sensibilidade e de nossa faculdade de pensar, assim acrescentamos aos objetos, mesmo antes que os tenhamos compreendido como objetos. A hipótese formulada por Kant contém, pois, como consequência fundamental, a diferenciação entre "coisa em si" e "fenômeno".
Para explicar essas duas coisas, foi necessário uma base na análise da faculdade do conhecimento e de seus princípios, assim Kant subdivide a metafísica em duas partes para tal, deste modo temos: uma metafísica do conhecimento experimental, uma metafísica problemática e uma metafísica transcendente a qualquer experiência que só seja possível nos modos práticos, mas que deverá ser preservada com um título problemático, já que ela possui sua base nas condições necessárias da razão. Seu conceito de incondicionado é necessário, porque esse conceito surge a partir do procedimento de síntese próprio da razão. Assim encontram-se razão e experiência, como a base das duas partes da metafísica, uma diante da outra, de modo irreconciliável. Desta maneira, o conceito necessário da razão contrapõe-se a todas as condições da experiência. Ele deverá, portanto, ser posto numa relação com o entendimento e a sensibilidade, ambos com os princípios da experiência que superam esta contradição. E é isso que se torna possível pela diferenciação entre coisa em si e manifestação (fenômeno), que corresponde, por sua vez, aquela entre pensar e conhecer.
A Crítica da razão pura é, na verdade, um tratado sobre o método para um sistema de conhecimento a priori, ela não é propriamente um sistema da ciência ou um sistema próprio da metafísica. A partir do modo como ela é planejada, deverá executar e comprovar aquela experimentação da razão, na qual a hipótese da diferenciação entre coisa em si e manifestação apresenta-se como sendo indispensável. Em outras palavras, podemos dizer que ela serve para comprovar a hipótese de que é válida a idéia segundo a qual as coisas se ajustam ao nosso entendimento. Além do mais, a Crítica fundamenta uma metafísica que pode ser concluída sistematicamente; Kant ainda afirma que a razão só tem a ver consigo mesma e não com a multiplicidade infinita de sua realidade e de sua manifestação.
Podemos, por fim, dizer que Kant argumenta que a metafísica seja um tanto limitada ao "uso regulativo da razão", ou seja, um conjunto de princípios que orientam a investigação e a reflexão filosófica, mas que não podem ser considerados como conhecimento objetivo. Sendo assim, ele sugere que a metafísica pode ser útil como uma atividade crítica, mas não como uma ciência no sentido estrito. Portanto, de acordo com Kant, a metafísica não pode ser transformada em uma ciência no mesmo sentido das ciências naturais, devido às suas limitações inerentes. Embora Kant tenha buscado estabelecer limites claros para a metafísica, assim suas ideias abriram caminho para uma nova abordagem filosófica que influenciou o pensamento posterior, incluindo a filosofia da linguagem, a fenomenologia e o pragmatismo.
Referências:
KANT, I. Crítica da razão pura. Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, 1994.
KESTERING, Julio Cesar. Considerações acerca da obra Crítica da razão pura de Kant.
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