Sobre a ética do ódio das redes sociais, por Janilson Fialho

 Sobre a ética do ódio das redes sociais

Por Janilson Fialho

A função da Ética é investigar e explicar o comportamento das pessoas ao longo de sua existência, visando a fixação de comportamentos “básicos”. Portanto, podemos dizer que a Ética diz respeito ao agir humano. 

Afirmo tal coisa para dizer, o que e já sabemos, que ela é uma forma de entender o agir, para justamente mostrar que ela pode também não ser uma coisa que visa, como aprendemos em algumas teorias éticas, necessariamente alcançar o "bem estar" do ser humano.

Podemos ver uma ética que distoa desse sentido, por exemplo, na Ilíada, de Homero, onde o agir é pautado pela lei do mais forte, isto é, por uma rígida conduta guerreira (com um teor religioso), na qual os reis e heróis combatem, tendo como conceitos norteadores a honra e a excelência, onde os grandes feitos contam para ter um lugar de fala e privilégio na sociedade. Aliás, tal ética revela as paixões que movem os personagens. Entretanto, não é a ética de Homero que buscamos falar aqui. Falaremos sobre a conduta ética das redes sociais.

Há uma ética na Internet, mais especificamente nas redes sociais, que impõe uma certa dinâmica na forma que, para se conquistar uma coisa ou relevância, você tem que promover o discurso de ódio e a discórdia. Esta ética das redes sociais está pautada de maneira estrutural no custo benefício da intolerância.

Poderia falar da outra dinâmica ética, isto é, a dos conteúdos de inutilidade como, por exemplo, as brigas de pseudo-famosos, os vídeo de humor, notícias que não tem nenhuma credibilidade, ou acompanhar uma vida falsa de uma influenciadora, etc. Mas vou me ater exclusivamente aqui ao discurso de ódio, porque este afeta de forma direta e indireta a vida das pessoas por sua repercussão negativa. Como as redes sociais fazem parte do cotidiano das pessoas e por serem mobilizadoras de ideias, por vezes, originando movimentos políticos e sociais que modificam a vida política.

Até pode-se dizer que não é correto afirmar que o discurso de ódio faça parte de maneira intrínseca da dinâmica das redes sociais. No entanto, para além do discurso formal propagado pelas próprias redes sociais, de que ali é um ambiente saudável, eu vejo por meio de algumas análises próprias e acadêmicas que o discurso de ódio é uma realidade presente nas redes sociais, e mostro alguns argumentos que podem  explicar essa situação.

O Anonimato é um problema, afinal muitas pessoas usam as redes sociais para expressar opiniões de forma anônima, o que pode levar a um aumento do discurso de ódio. Isto ocorre pelo fato de que as pessoas não precisam se identificar para expressar suas opiniões, assim elas podem se sentir mais à vontade para expressar sentimentos negativos e preconceituosos em relação a outras pessoas ou grupos.

Outro problema é o feito de grupo, ou efeito manada. As redes sociais são plataformas em que as pessoas se conectam em grupos e comunidades virtuais. Desta forma, quando as pessoas se sentem parte de um grupo, elas podem ser influenciadas pelo comportamento dos outros membros ou lider do grupo. Isso pode levar a um aumento do discurso de ódio, à medida que as pessoas tentam se organizar em um grupo e se alinhar com as opiniões expressas pelos outros membros. Um fenômeno que podemos falar que está nesse efeito manada, é o fenômeno do cancelamento. O cancelamento, segundo o pesquisador e professor Alexandre Linck, não funciona de fato, pois ele é feito de um grupo contra o outro, isto é, se um grupo progressista tenta cancelar uma pessoa reacionária, logo não vai funcionar porque os reacionários vão defender o reacionário, o contrário também é verdade. Aliás, o indivíduo cancelado ganha visibilidade, que se ele souber administrar pode sair como algo positivo, e a entrada, quase que involuntária, a um campo, ou grupo, ideológico. O cancelamento só funciona por uma via autofágica, ou seja, quando a própria bolha ideológica cancela um próprio membro, portanto,  só reacionário cancela reacionário, só progressista cancela progressista. Ou pode haver uma conciliação de ambos os grupos ideológicos em prol do cancelamento somente se o indivíduo cancelado tivesse cometido um delito que escapa do campo moral das duas ideologias.  

As redes sociais usam os algoritmos para recomendar conteúdo aos usuários. O problema é que esses algoritmos podem carregar o discurso de ódio, à medida que recomendam conteúdo que é mais propenso a gerar engajamento e compartilhamento. Isso pode incluir conteúdo que é emocionalmente carregado, sensacionalista ou controverso. Portanto, tal conteúdo contendo um fato distorcido da realidade pode gerar um pânico moral, levando as pessoas que tomam contato com esse conteúdo distorcido a se organizarem em grupos virtuais.

Contudo, chegamos ao problema que envolve diretamente as bigtechs, que é a falta de moderação por parte deles. Sabemos que as redes sociais muitas têm políticas de moderação que proíbem o discurso de ódio e outros comportamentos prejudiciais. No entanto, nem sempre é fácil para as empresas de redes sociais monitorar e moderar todo o conteúdo que é postado em suas plataformas, porque o sistema adotados por eles usando bots e chaves de palavras não funciona de fato. Como resultado, o discurso de ódio pode ser disseminado sem consequências, só bastando o indivíduo modificar as palavras-chave.

Posso usar como exemplo os bolsonaristas, porques esse grupo tem várias acusações sobre propagação de discurso de ódio nas redes sociais. Desde a campanha presidencial, os bolsonaristas usaram as redes sociais para disseminar suas ideias e mobilizar os apoiadores. Para eles, o uso de plataformas como o Twitter, Facebook, WhatsApp, e agora o Telegram, são essenciais para compartilhar notícias falsas, memes e outros conteúdos que apoiam Bolsonaro e suas ideias preconceituosas e intolerantes. Sabemos muito bem que eles usaram o WhatsApp para realizar uma onda de disparos em massa de mensagens cujo conteúdo era fake news e pânico moral.

A figura do influenciador entra nessa nossa crítica, pois há uma falta de responsabilidade social da parte deles. E mais ainda, muitas vezes eles se recusam a admitir seus erros ou a se retratarem quando são confrontados com informações corretas, imperando nesse meio o convívio do ego. Podemos argumentar que essas figuras públicas com grande alcance nas redes sociais, ou seja, esses influenciadores, têm uma responsabilidade especial em relação ao que compartilham com seus seguidores. Por fim, posso dizer que as pessoas sejam mais críticas em relação ao conteúdo que consomem nas redes sociais, e que se esforcem mais para combater o discurso de ódio e a desinformação.

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